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segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

A Canção de Amor - (J. Alfred Prufrock)


A Canção de Amor de J. Alfred Prufrock (tradução)

Então vem, vamos juntos os dois,
A noite cai e já se estende pelo céu,
Parece um doente adormecido a éter sobre a mesa;
Vem comigo por certas ruas semidesertas
Que são o refúgio de vozes murmuradas
De noites em repouso em hotéis baratos de uma noite
E restaurantes com serradura e conchas de ostra:
Ruas que se prolongam como argumento enfadonho
De insidiosa intenção
Que te arrasta àquela questão inevitável…
Oh, não perguntes “Qual será?”
Vem lá comigo fazer a tal visita.

Passeiam damas na sala para além e para aqui

E falam de Miguel Ângelo Buonarroti
A névoa amarela que esfrega as costas nas vidraças
O fumo amarelo que esfrega o focinho nas vidraças
Passou a língua dentro dos recantos da noite,
Demorou-se nos charcos que ficam na sarjeta,
Deixou cair nas costas a fuligem solta das chaminés,
Deslizou pelo terraço, de repente deu um salto,
E, ao ver serena aquela noite de Outubro,
Deu uma volta à casa, enroscou-se e dormiu.

Haverá por certo um tempo

Para o fumo amarelo que desliza pela rua
E esfrega as costas nas vidraças;
Haverá um tempo, tempo
De compor um rosto para olhares os rostos que te olharem;
Tempo de matar, tempo de criar,
E tempo para todos os trabalhos e os dias, de mãos
Que se erguem e te deixam cair no prato uma pergunta;
Tempo para ti e tempo para mim,
E tempo ainda para cem indecisões
E outras tantas visões e revisões
Antes de tomar o chá e a torrada.

Passeiam damas na sala para além e para aqui

E falam de Miguel Ângelo Buonarroti.

Haverá por certo um tempo

De pensar se corro tal risco. “Corro tal risco?”
Tempo de virar costas e descer as escadas
Com esta clareira calva no meio do cabelo –
(Hão-de dizer: “Este já tem pouco cabelo!”)
Com a casaca, colarinho hirto subido até ao queixo,
Gravata distinta e discreta mas ornada de um sóbrio alfinete –
(Hão-de dizer: “Que magro está, nos braços e nas pernas!”)
Vou correr o risco
De perturbar o universo?
Num só minuto há tempo
Para decisões e revisões, a revogar noutro minuto.

Pois já as conheço todas bem, conheço todas –

Sei as noites, as tardes, as manhãs,
Às colheres de café andei medindo a minha vida;
Sei que em breve agonia se esvaem as vozes
Abafadas na música de um quarto mais além.
Como havia eu de ousar, assim?

E já conheço os olhares, conheço todos –

Olhares que te reduzem a fórmulas e a dizeres,
E quando eu for apenas fórmula, esticado em alfinete,
Quando estiver na parede, trespassado, contorcido,
Como haverei então de começar
A cuspir as pontas de cigarro dos meus dias e jeitos?

E como havia eu de ousar, assim?

E já conheço os braços, conheço todos –
Braceletes nos braços brancos e nus
(Mas com uma penugem loira à luz do candeeiro)
Será pelo perfume de um vestido
Que sou levado assim a divagar?
Braços estendidos na mesa ou envoltos num xaile.
E havia eu de ousar assim?
Por onde havia eu de começar?

E se eu disser que dou passeios por becos quando anoitece,

E vou fitando o fumo que sobe do cachimbo
De homens em mangas de camisa, à janela, solitários?…

Eu devia ter sido um ferro de duas garras

A rasgar o fundo desses mares de silêncio.

E a tarde, a noite, a dormir tão sossegada!

Afagada por dedos esguios,
A dormir… exausta… ou a fingir,
Estirada aqui no chão, à beira de nós dois.
Depois do chá, dos bolos, dos gelados, eu tinha ainda
Aquela força que provoca a crise do instante?
Mas apesar de lágrimas e jejuns, lágrimas e preces,
E apesar de ter visto a minha cabeça (um tanto calva já) ser entreguenuma salva,
Não sou nenhum profeta – e isso pouco importa;
Já vi tremer o meu instante de esplendor
E vi o eterno lacaio agarrar-me a casaca, rindo sorrateiro,
E bastará dizer que tive medo.

E tinha valido a pena, depois de tudo isto,

Depois da geleia, das xícaras, do chá,
Entre porcelanas, a meio de qualquer conversa de nós dois,
Tinha valido a pena
Ter rematado o assunto com um sorriso,
Ter estreitado o universo numa bola
E fazê-la rolar, rumo a qualquer questão inevitável,
E dizer: “Sou Lázaro e venho de entre os mortos.
Voltei para vos contar tudo, vou contar-vos tudo” –
Se alguém, ajeitando a cabeça dela numa almofada,
Dissesse: “Não era nada disso que eu queria dizer
Não é isso, nada disso.”

E tinha valido a pena, depois de tudo,

Tinha mesmo valido a pena,
Depois dos pátios, dos poentes, das ruas chuviscadas,
Dos romances, das xícaras de chá, das saias arrastando pelo chão –
E depois disto e tantas coisas mais? –
Não é possível dizer mesmo o que quero dizer!
Mas se uma lanterna mágica mostrasse na tela a imagem dos nervos:
Tinha valido a pena
Se alguém, compondo a almofada ou tirando um xaile,
Dissesse, ao voltar-se para a janela:
“Não é isso, nada disso,
Não era nada disso que eu queria dizer.”

Não! Não sou o príncipe Hamlet e nem tinha que ser;

Sou um fidalgo da corte, desses que servem
Para aumentar a comitiva, abrir uma ou duas cenas,
Dar conselhos ao príncipe; instrumento dócil, é claro,
Reverente, satisfeito por ser prestável,
Político, meticuloso e avisado;
Cheio de sentenças doutas, um tanto obtuso todavia;
Às vezes, por sinal, quase ridículo –
Quase o bobo, às vezes.

Estou a ficar velho… Estou a ficar velho…

Hei-de andar com a dobra da calça revirada.

E se eu puxar atrás o risco do cabelo? Arrisco-me a trincar

um pêssego?
Hei-de vestir calça de flanela branca e passear na praia.
Já ouvi as sereias cantando, umas às outras.

Creio que para mim não vão cantar.

Tenho-as visto na direcção do mar a cavalgar as ondas
Penteando crinas brancas de ondas encrespadas
Quando o vento revolve as águas escuras e brancas.

Ficámos nas mansões do mar nós dois em abandono

Entre as ondinas com grinaldas de algas castanhas purpurinas
Até que vozes humanas nos despertam e morremos naufragados.

Tradução: João Almeida Flor




The Love Song of J. Alfred Prufrock (original)


Let us go then, you and I,

When the evening is spread out against the sky
Like a patient etherized upon a table;
Let us go, through certain half-deserted streets,
The muttering retreats
Of restless nights in one-night cheap hotels
And sawdust restaurants with oyster-shells:
Streets that follow like a tedious argument
Of insidious intent
To lead you to an overwhelming question. . .
Oh, do not ask, “What is it?”
Let us go and make our visit.

In the room the women come and go

Talking of Michelangelo.

The yellow fog that rubs its back upon the window-panes

The yellow smoke that rubs its muzzle on the window-panes
Licked its tongue into the corners of the evening
Lingered upon the pools that stand in drains,
Let fall upon its back the soot that falls from chimneys,
Slipped by the terrace, made a sudden leap,
And seeing that it was a soft October night
Curled once about the house, and fell asleep.

And indeed there will be time

For the yellow smoke that slides along the street,
Rubbing its back upon the window-panes;
There will be time, there will be time
To prepare a face to meet the faces that you meet;
There will be time to murder and create,
And time for all the works and days of hands
That lift and drop a question on your plate;
Time for you and time for me,
And time yet for a hundred indecisions
And for a hundred visions and revisions
Before the taking of a toast and tea.

In the room the women come and go

Talking of Michelangelo.

And indeed there will be time

To wonder, “Do I dare?” and, “Do I dare?”
Time to turn back and descend the stair,
With a bald spot in the middle of my hair -
[They will say: "How his hair is growing thin!"]
My morning coat, my collar mounting firmly to the chin,
My necktie rich and modest, but asserted by a simple pin -
[They will say: "But how his arms and legs are thin!"]
Do I dare
Disturb the universe?
In a minute there is time
For decisions and revisions which a minute will reverse.

For I have known them all already, known them all;

Have known the evenings, mornings, afternoons,
I have measured out my life with coffee spoons;
I know the voices dying with a dying fall
Beneath the music from a farther room.
So how should I presume?

And I have known the eyes already, known them all -

The eyes that fix you in a formulated phrase,
And when I am formulated, sprawling on a pin,
When I am pinned and wriggling on the wall,
Then how should I begin
To spit out all the butt-ends of my days and ways?
And how should I presume?

And I have known the arms already, known them all -

Arms that are braceleted and white and bare
[But in the lamplight, downed with light brown hair!]
Is it perfume from a dress
That makes me so digress?
Arms that lie along a table, or wrap about a shawl.
And should I then presume?
And how should I begin?

Shall I say, I have gone at dusk through narrow streets

And watched the smoke that rises from the pipes
Of lonely men in shirt-sleeves, leaning out of windows? . . .

I should have been a pair of ragged claws

Scuttling across the floors of silent seas.

And the afternoon, the evening, sleeps so peacefully!

Smoothed by long fingers,
Asleep . . . tired . . . or it malingers,
Stretched on the floor, here beside you and me.
Should I, after tea and cakes and ices,
Have the strength to force the moment to its crisis?
But though I have wept and fasted, wept and prayed,
Though I have seen my head (grown slightly bald) brought in upon a platter,
I am no prophet–and here’s no great matter;
I have seen the moment of my greatness flicker,
And I have seen the eternal Footman hold my coat, and snicker,
And in short, I was afraid.

And would it have been worth it, after all,

After the cups, the marmalade, the tea,
Among the porcelain, among some talk of you and me,
Would it have been worth while,
To have bitten off the matter with a smile,
To have squeezed the universe into a ball
To roll it toward some overwhelming question,
To say: “I am Lazarus, come from the dead,
Come back to tell you all, I shall tell you all”
If one, settling a pillow by her head,
Should say, “That is not what I meant at all.
That is not it, at all.”

And would it have been worth it, after all,

Would it have been worth while,
After the sunsets and the dooryards and the sprinkled streets,
After the novels, after the teacups, after the skirts that trail along the floor -
And this, and so much more? -
It is impossible to say just what I mean!
But as if a magic lantern threw the nerves in patterns on a screen:
Would it have been worth while
If one, settling a pillow or throwing off a shawl,
And turning toward the window, should say:
“That is not it at all,
That is not what I meant, at all.”

No! I am not Prince Hamlet, nor was meant to be;

Am an attendant lord, one that will do
To swell a progress, start a scene or two
Advise the prince; no doubt, an easy tool,
Deferential, glad to be of use,
Politic, cautious, and meticulous;
Full of high sentence, but a bit obtuse;
At times, indeed, almost ridiculous -
Almost, at times, the Fool.

I grow old . . . I grow old . . .

I shall wear the bottoms of my trousers rolled.

Shall I part my hair behind? Do I dare to eat a peach?

I shall wear white flannel trousers, and walk upon the beach.
I have heard the mermaids singing, each to each.
I do not think they will sing to me.

I have seen them riding seaward on the waves

Combing the white hair of the waves blown back
When the wind blows the water white and black.

We have lingered in the chambers of the sea

By sea-girls wreathed with seaweed red and brown
Till human voices wake us, and we drown.



segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Os Velhos - (Carlos Drummond de Andrade)



Os Velhos

Todos nasceram velhos — desconfio.
Em casas mais velhas que a velhice,
em ruas que existiram sempre — sempre
assim como estão hoje
e não deixarão nunca de estar:
soturnas e paradas e indeléveis
mesmo no desmoronar do Juízo Final.

Os mais velhos têm 100, 200 anos
e lá se perde a conta.
Os mais novos dos novos,
não menos de 50 — enorm'idade.
Nenhum olha para mim.
A velhice o proíbe. Quem autorizou
existirem meninos neste largo municipal?

Quem infrigiu a lei da eternidade
que não permite recomeçar a vida?
Ignoram-me. Não sou. Tenho vontade
de ser também um velho desde sempre.
Assim conversarão
comigo sobre coisas
seladas em cofre de subentendidos
a conversa infindável de monossílabos, resmungos,
tosse conclusiva.

Nem me vêem passar. Não me dão confiança.
Confiança! Confiança!
Dádiva impensável
nos semblantes fechados,
nos felpudos redingotes,
nos chapéus autoritários,
nas barbas de milénios.
Sigo, seco e só, atravessando
a floresta de velhos.

Carlos Drummond de Andrade, in 'Boitempo'

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Para Viver um Grande Amor - Carlos Drummond de Andrade




Para Viver um Grande Amor


É preciso abrir todas as portas que fecham o coração.

Quebrar barreiras construídas ao longo do tempo,
Por amores do passado que foram em vão.
É preciso muita renúncia em ser e mudança no pensar.
É preciso não esquecer que ninguém vem perfeito para nós!
É preciso ver o outro com os olhos da alma e se deixar cativar!
É preciso renunciar ao que não agrada ao seu amor...
Para que se moldem um ao outro como se molda uma escultura,
Aparando as arestas que podem machucar.
É como lapidar um diamante bruto...para fazê-lo brilhar!
E quando decidir que chegou a sua hora de amar,
Lembre-se que é preciso haver identificação de almas!
De gostos, de gestos, de pele...
No modo de sentir e de pensar!
É preciso ver a luz iluminar a aura,
Dando uma chance para que o amor te encontre.
Na suavidade morna de uma noite calma...
É preciso se entregar de corpo e alma!
É preciso ter dentro do coração um sonho
Que se acalenta no desejo de: amar e ser amada!
É preciso conhecer no outro o ser tão procurado!
É preciso conquistar e se deixar seduzir...
Entrar no jogo da sedução e deixar fluir!
Amar com emoção para se saber sentir.
A sensação do momento em que o amor te devora!
E quando você estiver vivendo no clímax dessa paixão,
Que sinta que essa foi a melhor de suas escolhas!
Que foi seu grande desafio... e o passo mais acertado
De todos os caminhos de sua vida trilhados!
Mas se assim não for...Que nunca te arrependas pelo amor dado!
Faz parte da vida arriscar-se por um sonho...
Porque se não fosse assim, nunca teríamos sonhado!
Mas, antes de tudo, que você saiba que tem aliado.
Ele se chama TEMPO... seu melhor amigo.
Só ele pode dar todas as certezas do amanhã...
A certeza que... realmente você amou.
A certeza que... realmente você foi amada."

Felicidade Realista - Mário Quintana






FELICIDADE REALISTA 


A princípio bastaria ter saúde, dinheiro e amor, o que já é um pacote louvável, mas nossos desejos são ainda mais complexos. 
Não basta que a gente esteja sem febre: queremos, além de saúde, ser magérrimos, sarados, irresistíveis. Dinheiro? 
Não basta termos para pagar o aluguel, a comida e o cinema: queremos a piscina olímpica e uma temporada num spa cinco estrelas. 
E quanto ao amor? Ah, o amor... não basta termos alguém com quem podemos conversar, dividir uma pizza e fazer sexo de vez em quando. Isso é pensar pequeno: queremos AMOR, todinho maiúsculo. 
Queremos estar visceralmente apaixonados, queremos ser surpreendidos por declarações e presentes inesperados, queremos jantar a luz de velas de segunda a domingo, queremos sexo selvagem e diário, queremos ser felizes assim e não de outro jeito. 
É o que dá ver tanta televisão. Simplesmente esquecemos de tentar ser felizes de uma forma mais realista. 
Ter um parceiro constante pode ou não, ser sinônimo de felicidade. Você pode ser feliz solteiro, feliz com uns romances ocasionais, feliz com um parceiro, feliz sem nenhum. Não existe amor minúsculo, principalmente quando se trata de amor-próprio. Dinheiro é uma benção. 
Quem tem, precisa aproveitá-lo, gastá-lo, usufruí-lo. Não perder tempo juntando, juntando, juntando. Apenas o suficiente para se sentir seguro, mas não aprisionado. 
E se a gente tem pouco, é com este pouco que vai tentar segurar a onda, buscando coisas que saiam de graça, como um pouco de humor, um pouco de fé e um pouco de criatividade. Ser feliz de uma forma realista é fazer o possível e aceitar o improvável. 
Fazer exercícios sem almejar passarelas, trabalhar sem almejar o estrelato, amar sem almejar o eterno. 
Olhe para o relógio: hora de acordar É importante pensar-se ao extremo, buscar lá d entro o que nos mobiliza, instiga e conduz, mas sem exigir-se desumanamente. 
A vida não é um jogo onde só quem testa seus limites é que leva o prêmio. Não sejamos vítimas ingênuas desta tal competitividade. 
Se a meta está alta demais, reduza-a. Se você não está de acordo com as regras, demita-se. Invente seu próprio jogo. 
Faça o que for necessário para ser feliz. Mas não se esqueça que a felicidade é um sentimento simples, você pode encontrá-la e deixá-la ir embora por não perceber sua simplicidade. 
Ela transmite paz e não sentimentos fortes, que nos atormenta e provoca inquietude no nosso coração. Isso pode ser alegria, paixão, entusiasmo, mas não felicidade.

Mario Quintana


terça-feira, 6 de novembro de 2012

Liberte-se (Mônica Buonfiglio)



Liberte-se:
Da necessidade de receber amor.De dar conselhos sem que tenha sido solicitado.
Da necessidade de se sentir importante.
Da ilusão de saber o que é bom para o outro.
Da necessidade de ser aceito ou sentir que merece mais do que
recebe.
Da necessidade de controlar os que o cercam.
Da necessidade de sentir prazer sempre.
Das futilidades e de passatempos que não dizem respeito à alma.
Da necessidade de lamentar algo que não conseguiu.
Da preocupação com aquilo que os outros pensam de você.
Da necessidade de culpar os outros por suas falhas e de apontar as falhas alheias.
Da aversão àqueles que não concordam com suas idéias.
Da necessidade de ser elogiado ou notado.
Do vício de sofrer pelo que já não existe e pelo que talvez não venha a existir.
Liberte-se!










sexta-feira, 11 de maio de 2012

Feliz Dia das Mães


Tu, grande Mãe!... do amor de teus filhos escrava, 

Para teus filhos és, no caminho da vida, 

Como a faixa de luz que o povo hebreu guiava 

À longe Terra Prometida. 

Jorra de teu olhar um rio luminoso. 
Pois, para batizar essas almas em flor, 
Deixas cascatear desse olhar carinhoso 
Todo o Jordão do teu amor. 

E espalham tanto brilho as asas infinitas 
Que expandes sobre os teus, carinhosas e belas, 
Que o seu grande dano sobe, quando as agitas, 
E vai perder-se entre as estrelas. 

E eles, pelos degraus da luz ampla e sagrada, 
Fogem da humana dor, fogem do humano pé, 
E, à procura de Deus, vão subindo essa escada, 
Que é como a escada de Jacó. 

Olavo Bilac, in "Poesias"

Minha homenagem a todas as mães e em especial a minha... 

Lágrima de Preto - António Gedeão


Encontrei uma preta 
que estava a chorar 
pedi-lhe uma lágrima 
para a analisar
Recolhi a lágrima 
com todo o cuidado 
num tubo de ensaio 
bem esterilizado
Olhei-a de um lado 
do outro e de frente 
tinha um ar de gota 
muito transparente
Mandei vir os ácidos 
as bases e os sais 
as drogas usadas 
em casos que tais
Ensaiei a frio 
experimentei ao lume 
de todas as vezes 
deu-me o qu´é costume
Nem sinais de negro 
nem vestígios de ódio 
água (quase tudo) 
e cloreto de sódio


Lágrima de Preta

António Gedeão